terça-feira, 22 de abril de 2008

Nilson...


- Alô, Nilson?

- Oi.

- Nilson, feliz 2008. Feliz 2008 pra você... Que nós sejamos felizes nessa etapa que se finaliza...

- Tá. Te amo.

- Eu também te amo, Nilson. Nunca esquece disso, tá? Eu te amo... Te amo muito. Beijo!

O seguinte diálogo aconteceu num sonho que eu tive essa madrugada... Alguém me entregava um telefone e eu falava com o Nilson e desejava Feliz 2008 e dizia que o amava... Pena que não se pode mesmo pegar um telefone pra falar com ele. Pena que eu não possa vê-lo, nunca mais, a não ser em sonhos como este... Porque Nilson foi morar com Deus, há dois anos. Dois longos anos...

Nilson... ou melhor, Josenilson Ferreira de Lima, era um amigo amado. Era uma dessas poucas pessoas que eu amo de verdade. Porque eu amo poucas pessoas. Gosto de um monte, mas eu conto nos dedos, as que eu realmente amo. Amor, só é pra quem merece, não deve ser desperdiçado e com o Nilson, nunca se desperdiçava amor.

Eu o conheci quando minha mãe me mudou de colégio pra eu fazer o terceiro ano. Eu saí do centro da cidade pra voltar pra escola de bairro e eu detestei absurdamente aquilo. Não por ser escola de bairro... eu estudei em escolas assim durante toda a minha vida. O que me irritou foi a escola que ela escolheu. Eu a odiei desde o momento em que coloquei meus olhos nela.

Por causa disso, eu decidi que não faria parte daquilo de verdade. Deixaria passar aquele último ano de escola, sem fazer amizades com ninguém, como se eu não fosse integrante daquele mundo.

Mas, droga! O Nilson colocou tudo isso por água abaixo. Porque, já no primeiro dia, eu fiquei me contorcendo pra não rir de tudo o que ele falava. Eu não me via no direito de rir das "gaiatices" dele porque me achava totalmente a parte daquele grupo, que já se conhecia e tinha intimidade. E como era que eu podia fazer isso se ele sentava ao meu lado?! Foi uma terefa difícil... rsrsrs

Durante uns poucos dias, eu resisti bravamente. Mas, poxa, não tive como suportar! E desejava com uma força absurda, ser amiga daquele cara...

Um dia, ele conversava com as meninas que sentavam à minha frente, sobre música é claro, coisa que ele totalmente adorava. E também, é claro, que ele falava especificamente sobre Beatles e John Lennon. Eu fiquei prestando atenção na conversa deles, porque eu já falava com as meninas, então eu meio que me incluí na conversa, como espectadora. Ele percebeu isso e me incluiu de verdade me perguntando, com aquele jeito cavalheiro-forçado-de-propósito, rsrsrs, se eu gostava de John Lennon. Eu disse que sim e que meu pai tinha um disco dele, de vinil, bem antigo...

Eu vi os olhos dele se arregalarem, como se eu tivesse dito que o próprio John Lennon estava vivo e morava na despensa da minha casa.

Ele me pediu pra dizer como era o disco, pra saber se ele já tinha. Eu falei como era...

- Eu ainda não tenho esse. Tá valendo uns trinta reais...

- Eu vou procurar lá em casa e eu trago pra ti.

- Ou... num acredito!!! Ave Maria!!!

- rsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrs

Quando eu cheguei em casa, a primeira coisa que fiz, foi procurar o bendito disco e, quando encontrei, não via a hora de chegar na escola pra mostrar pra ele.

Pareceu que nunca ia chegar... Quando eu entrei na sala de aula, ele já estava lá. Esperei um momento, em que ele olhasse diretamente pra mim e eu pudesse dizer:

- Eu achei o disco!

- Num acredito!!

- Tá aqui na minha mochila.

Ele se ajoelhou de frente pra ela e ficou olhando... Eu tirei o disco e entreguei pra ele. Ele tocava como se fosse a coisa mais valiosa do mundo... Então ele me entregou de volta e eu disse:

- É teu. Eu trouxe pra ti!

- Conversa, menina!

- É sério! Pode ficar com ele.

Ele não coube em si de tanta felicidade e eu soube que tinha entrado no coração dele e ele no meu...

Ele mostrou pra todo mundo e disse pra todo mundo que EU havia dado o disco pra ele. Eu vi as pessoas me olharem como se tivessem me visto pela primeira vez e, eu ganhei um certo respeito, por ser amiga dele agora.

O Nilson me fazia rir o tempo todo e detestava o fato de eu falar baixo, porque ele quase nunca ouvia direito. Às vezes, quando eu respondia e ele não escutava, dizia bem alto, de propósito, pra chamar a atenção das pessoas:

- FALA ALTO!! ASSIM, PRA GENTE OUVIR!!

E eu queria me enfiar dentro da minha mochila. Me matava de vergonha...

Foi o Nilson que me ensinou o que era rock de verdade, me deu muita coisa pra ler, biografias dos grandes astros, CDs pra eu ouvir, toda a coleção dos Bealtes... Eu aprendi muito.

Ele me pedia pra tirar letras e fotos pra ele, da internet e traduzir as músicas preferidas dele... Eu sentia que ele gostava daquilo... De me ensinar. Ele dizia que morria de ciúme do material dele, dos livros, das revistas, dos Cds... mas que pra mim, ele emprestava. Só pra mim.

Um dia ele virou pra mim, de repente, e disse como eu ia encontrar o amor da minha vida...

- Tu vai estar saindo do supermercado, com uma sacola cheia de laranjas... Aí a sacola vai rasgar... BEI!! Vai cair laranja pra todo lado. Tu vai te abaixar e um cara vai pegar a mesma laranja que tu. E vocês vão se olhar nos olhos... (E imitou o olhar e tudo... rsrs).

Ah, Nilson... ando mais em supermercados, ultimamente. Mas nunca pra comprar laranjas, será que é medo da sua "profecia" se realizar? rsrs

O Nilson foi quem me deu o presente de aniversário mais lindo e maravilhoso do mundo todo. Eu ia fazer 18 anos e disse que organizaria uma festa e queria que ele fosse... Eu faço aniversário no dia 16 de Julho. No fim do semestre, no último dia de aula, ele chegou pra mim, me mostrou uma flor de papel crepom, daquelas que a avó da gente faz, coberta com parafina e disse:

- Eu não vou estar aqui no dia 16, porque eu vou viajar, mas eu vou ligar pra ti no dia...

E me entregou a flor.

Eu achei aquele, o gesto mais bonito e fiquei emocionada e dizendo o tempo todo, como eu o amava. As pessoas ficaram caçoando, dizendo que eu estava a fim dele... Elas não entendiam que a gente podia amar as pessoas e dizer isso pra elas, sem que fosse o namorado ou coisa do tipo. Tenho pena delas.

O Nilson sempre dizia que era bruto. Mas ele não era. Coisas como essas diziam abertamente isso. Eu vi como ele ficou sem graça quando me entregou a flor... Ele era o amor.

No dia do meu aniversário, ele não ligou. Foi no dia seguinte que ele fez isso. A ligação estava ruim, ele estava no interior do Maranhão e disse que, só não ligou no dia anterior, porque não tinha conseguido ir pra cidade. Mas ele lembrou... Pessoas que se diziam minhas amigas, não lembraram. Pessoas que moravam perto de mim. Mas ele, sim.

Quando o Nilson passou no vestibular, eu que dei a notícia pra ele. Ele passou na segunda chamada, eu vi no jornal e liguei pra dar os parabéns. Ele achou que eu estivesse... como era que ele dizia? "Frescando com a cara dele". Ele me agradeceu e saiu correndo pra comprar o jornal.

Nós passamos a nos encontrar nos corredores da universidade, mas quase nunca nos falávamos. O Nilson era um cara esquisito, mas eu sabia entender e respeitar a esquisitice dele.

Quando a gente estudava junto e ele chegava com a cara fechada, parecendo que ia matar o primeiro que cruzasse o caminho dele a golpes de machado... e as pessoas ficavam perguntando o que ele tinha, eu ficava na minha, fingindo que ele não estava nem ali e esperando o tempo certo. E a primeira pessoa com quem ele falava ali, era sempre eu. Ele entendia que eu o entendia.

E na universidade não foi diferente. A gente se esbarrava e se tratava como estranho, mas de repente, num dia qualquer, a gente conversava como se ainda se encontrasse todo dia na escola.

- Às vezes eu passo e não falo contigo... Mas tu sabe como é meu jeito! Eu sou doido!

- Eu sei Nilson, eu sei...

No último dia em que a gente se viu, na parada de ônibus, eu apenas o cumprimentei como tantas vezes e fui conversar com minhas amigas. Então ele me chamou, com um sorriso e perguntou:

- Advinha quem chegou?

- Joniel! - Eu falei.

Era o grande amigo do Nilson, quase irmão, que tinha ido morar em Londres e que estudou com a gente também. Foi meu amor platônico do terceiro ano, rsrsrs, o Nilson sabia disso.

- Ele tá pra São Luis, mas chega segunda-feira. Liga pra ele! Tu tem o telefone?

- Não...

- Então anota aí!!

Eu anotei, mais por fazer a vontade dele do que por interesse de ligar. Durante dois anos a gente não se falou e, antes dele viajar, a gente já se via bem pouco. Mas o Nilson tava tão empolgado...

- Liga pra ele!!!

Eu nem imaginava o quanto aquele telefone me seria últil...

No dia em que um aneurisma pegou o Nilson distraído, recebi um telefonema da minha amiga, que falava aos gritos:

- O Nilson morreu!! O Nilson morreu!! - E a ligação caiu...

Então eu lembrei do telefone do Joniel, escrito apressadamente em meu caderno e liguei pra ele. E quando eu falei com o Joniel, pela primeira vez em dois anos e meio, foi pra ouvir ele dizer que o Nilson não estava mais entre nós...

Eu não fui me despedir do Nilson... não tinha forças. Não fui ao velório, nem enterro, nem missa de sétimo dia. Era como se eu estivesse vivendo em um mundo paralelo, fora do meu corpo... Eu sonhei com ele durante toda a noite e de quando em quando, eu acordava e achava que a morte dele é que era sonho, um pesadelo. O refrão da música do John Lennon não me saia da cabeça. A cada hora que eu acordava, ela tocava...

"I love you, yeah, yeah

Now and forever..."

E eu caí de cama e não registrei mais nada ao meu redor a não ser a falta que ele ia me fazer.

Eu sonhava com ele todos os dias. Eu dizia pra ele que ele tinha morrido, que ele tinha que aceitar... Na verdade, quem tinha que aceitar era eu.

Eu sempre soube que tinha esta pendência: escrever sobre ele.

Eu tinha que dizer o quanto eu o amei e ainda o amo. Pra sempre. Pra sempre.

Eu guardo aquela flor... Ela é meu elo com ele. É meu presente lindo. Eu vou lembrar sempre, de todas as risadas que eu dei, de todas as SUAS risadas, estridentes, altas, das palhaçadas, das meiguices que só eu via, na maioria das vezes.

Eu te amo sempre. Sempre...




2 comentários:

Manoel Filho disse...

É, Lanussa.. você conseguiu arrancar lágrimas desse que te escreve, e que também se diz "Bruto" mas não passa de uma manteiga derretida. Não chorei, mas não conseguí evitar que uma lágrima rolasse em meu olhar. Tenha Fé que Nilson está em um lugar maravilhoso, olhando e orando por você. Um dia vocês se encontraram... na Eternidade. Um Beijo bem grandãozão pra tú.. rsrs

Jonathas disse...

Lendo o que você escreveu, não consegui conter as lágrimas que agora rolam pelo meu rosto.
No dia do velório dele, eu chorava como se tivesse perdido um irmão, e na verdade é o que ele era. passei parte da noite com o Isac e o Luís Carlos bebendo e chorando ao lembrar das coisas que tinhamos vivido juntos, o Léo também tava lá chorando junto com a gente, parecia uma pesadelo.
Lembro de uma vez em que ele quase me mata de tanto rir, ele estava esperando o ônibus pra ir pra universidade, quando eu desci do ônibus do outro lado da rua e fui encontrar com ele, eu estava com o jaleco pendurado no ombro, e ele disse que eu tava parecendo um "MAGAREFF", daqueles que cortam e vendem carne no mercado, e era assim que ele me chamava quando nos encontravamos naquela mesma bendita parada de ônibus.
O Nilson era mesmo demais, insuibstituível, INESQUECÍVEL...