quinta-feira, 24 de abril de 2008

Lembranças...




Não é fácil a gente perder as pessoas que ama... Ainda mais pela culpa que vem junto. Culpa de não ter dado o valor que aquela pessoa merecia, de ter procurado ficar mais junto e aproveitar mais todos os momentos.

Eu senti essa culpa. A gente morava perto e eu deixei de ir lá, jogar conversa fora, depois que a gente saiu da escola. A gente estudava no mesmo prédio da univesidade e se esquivava da presença um do outro.

Eu pedi que o Nilson me desse umas aulas de desenho, pra eu ter um pouco mais de noção e poder fazer o teste para o curso técnico de artes plásticas, que ele também tinha feito. Eu liguei pra ele, a mãe dele foi chamar e ele atendeu com toda aquela delicadeza que ele sempre tinha...

- Que é?

- Ave Maria... Deixa de ser bruto! rsrs

Ele disse que ia me ensinar, falou o material que eu ia precisar e a gente marcou...

Eu não fui. Eu estava na casa de uma amiga minha, perto da casa dele, bem pertinho e eu não fui... Inventei uma desculpa qualquer, liguei pra ele e não o vi mais...

Mas a gente nunca aprende. É um defeito terrível que a gente tem, essa mania egoísta de achar que os amigos são imortais e que não ousarão morrer primeiro.

E agora, ele só vive na minha lembrança...

Um dia o Nilson me levou um teste de Q.I pra fazer na sala de aula. Ele fazia essas coisas comigo porque sabia que eu embarcava nas doidices dele, rsrsrs. Quando eu terminei, ele contou os pontos e disse:

- Até que tu te saiu bem... (como quem dissesse: "pobrezinha... tem que se esforçar mais...).

Mas tinha umas perguntas lá, com umas respostas bem duvidosas... rsrsrs.

Eu tinha uma lista de nomes, que eu fazia pra quando fosse escolher os nomes dos meus filhos. Ele achou a lista interessante mas... resolveu dar a sua pequena contribuição. Então ele acrescentou:

->Nilson (é claro);
->Ozzy Osbourne;
->Robert Plant;
->John Paul Jones;
->Jimmy Page;
->John Bonham.

Só me surpeendi por ele não ter acrescentado o nome, John Lennon, à lista. Talvez ele não achasse que o meu filho fosse digno de carregar o nome do grande ídolo dele, rsrs.

Outro dia, eu pedi pra ele escrever na minha agenda. Aquelas coisas que a gente tem quando é adolescente (e menina) de pedir pros outros escreverem falsidades para gente ler uma vez e esquecer no fundo do armário.

Ele disse que não estava com cabeça pra escrever e que faria isso num outro dia. Eu continuei insistindo. E ele continuou avisando...

- Olha, se eu pegar essa tua agenda aí, eu vou fazer uma coisa que tu não vai gostar...

Eu paguei pra ver. Talvez fosse isso que ele gostasse em mim, também. Outra pessoa, no meu lugar, teria dito: "Ah, não! Não vai estragar minha agenda!"

Então ele tomou da minha mão e fez uns rabiscos toscos com caneta preta, bem na página em que estava escrito um poema de Vinícius de Moraes. Coisas do Nilson.

Até que um dia, ele chegou pra mim e pediu a agenda. E escreveu assim:


"De: Josenilson Ferreira de Lima
Para: Lanussa Raquel


EU não tenho o que escrever!
Não tenho o que dizer!
Estou muito ruim da cabeça!
Não estou nem aí, se
minha letra estiver ruim,
pois aos poucos estou
resurgindo do meu fim!

Você sabe que uma pessoa, que é difícil mentir, sou eu.
Antes de te conhecer, eu pensava que você era muito antipática, chata etc...
Mas, com o tempo, aprendi que não se deve julgar as pessoas pela aparência.
Você sabe que, você contribuiu para analizar minha consciência!
Continue assim, (deixe um pouco de ser tímida), amiga, compreensiva e atenciosa, pois as pessoas ao seu redor precisam de você!!!!!!!!!!!!!!!

Josenilson Ferreira de Lima"


Essas palavras escritas num letra forte e marcante, são como um pedaço dele.

Houve uma vez em que nós estávamos conversando e eu dei uma resposta que ele não gostou (mas, de brincadeira, é claro), então ele fechou a mão como se fosse me dar um murro e, quando ele chegou bem perto do meu rosto, desviou depressa e bateu na parede atrás de mim. O Nilson era grande e tinha uma força terrível. Eu não queria mesmo estar no caminho daquele punho... Ele bateu com tanta força que os nós dos dedos dele, sangraram.

Então ele pingou umas três gotas de sangue, bem fraquinhas, na divisória do meu fichário e, em cima disso, ele desenhou a palma da mão dele (que tomou a página toda) e um esqueleto tocando guitarra e uma seta apontando para as gotas de sangue com as palavras: "sangue do Nilson".

Ele era bastante criativo e desenhava muito bem e fazia uns poemas doidos que ele me mostrava sempre. Pra mim e pro Joniel e eu me sentia muito especial...

Ainda me sinto. Quando eu lembro dele e da forma como ele me tratava, eu me sinto especial por ter sido escolhida por ele, para ser sua amiga.

Gostaria que vocês o tivessem conhecido... Gostariam dele também, tenho certeza.

Nilson, aparece sempre nos meus sonhos, tá? Não me deixa te esquecer... Não deixa.





2 comentários:

Manoel Filho disse...

Pois é Lanussa... a vida tem dessas coisas! Não espere alguém dizer "Eu te Amo" para dizer "Eu também".

Pelo que você escreveu, esse cara era, realmente, muito "bacana". Mas Deus o tirou deste mundo, para que a Alma dele não fosse contaminada pelas imundícies dos nossos dias.. Ele está em um plano Melhor e Maior, pode ter certeza. Ah! Parabéns por mais um belíssimo texto (post). Beijão!!

O Profeta disse...

Porque sonhas com o outro lado
Enches o vazio da eterna espera
Amas quem não podes ter
Pintas de realidade a quimera


A liberdade do pensamento vive entre dois mundos…


Convido-te a conhece-la…


Boa semana


Mágico beijo